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Sentimento de gratidão invade a minha consciência. Rápido e de modo sorrateiro, deixo transbordar a felicidade que me consome.
Como é bom ser feliz... Como é bom estar feliz.
Essa felicidade tem motivo, e é, a partir dela, que vou engatar de vez no ramo da Literatura Nacional. Depois da premiação do Projeto Coletânea FB, onde obtive o 1º lugar no Setor “Crônica” e o 1º lugar geral da OEFB (Organização Educacional Farias Brito), com o texto “O lado de fora de João Miguel”, levando-me a mudar o nome do blog para “As mentes da Literatura Internacional”.
Agradeço mais uma vez pelo o apoio de todos.
Espero que aproveitem bastante a nova cara do Blog e o seu estilo.

Obrigado!
                                                                      Atenciosamente,
                                                                    
Eduardo Mulato                                                                                
 Blogueiro Oficial


        

       Bato a vista no horizonte. Vejo a ida de Chico. Cara de derrota. Feição já cadavérica. O que será que acontecerá com ele? A seca poderá matá-lo. Que desgraçada. Estou perdendo os meus açudes e plantações, acho até difícil o juazeiro resistir.
        Terra almadiçoada, esquecida por Deus. Entretanto, Ele existe para os ricos. Deve achar que somos animais.
        Chico e sua família estão cada vez mais distantes, confundindo com miragens aguadas provocadas pelo forte calor na terra batida.
        Sinto mais pena de Josias. Espero que o infeliz consiga se salvar, pois a fome e a sede serão constantes, perguntas se alojaram em sua mente e vermes em sua barriga.
        Pergunto-me, às vezes, se era realmente necessário mandar Chico e família embora ao liberar o gado. Ele pelo menos recebeu a passagem de trem para ir aos campos de concentração, mas decidiu vendê-la e comprar um jumentinho com o dinheiro. Atitude que espero que não se arrependa.
        Sumiu por completo, mas sinto o cheiro da sua esperança e da sua fé. Que Deus surja e ilumine a todos dessa família, pois irão precisar.


Eduardo Mulato do Vale


         Fonte da Imagem  

            Vejo João Miguel a sofrer. Sofrimentos que trazem à tona o conflito interno por que ele passa. Monólogos, com certeza, são constantes. Apresenta um olhar intrigante, meio sofrido, meio misterioso. Não é um mistério comum, é como se fosse o infinito dentro de outro infinito. Complexo, não acha?
             Sou apenas o carcereiro do presídio onde João está. Paro alguns minutos e fico a visualizar seus conflitos. O que será que está passando pela sua cabeça agora? Será que pensa o quanto é injusta a justiça, que funciona bem para os ricos e de maneira eficiente e, quem sabe, tardia para os pobres?
             João Miguel ainda tem sorte de receber visitas de vez em quando. Há outros que foram esquecidos até por Deus. Esses, com certeza, estão arruinados. Injustiça dentro da justiça. É contraditório, mas é a realidade, nada de surrealismo nessa prisão.
            Continuo a ver João. Apresenta-se inquieto, inquestionável, sorrateiro. Desliza-se entre a loucura e a consciência. Infeliz. Preconceitos serão obtidos no fim de tudo, no fim de sua vida medíocre. Esse é um mal abstrato de um mundo concreto, onde os presidiários, com João Miguel, tendem a lutar contra a sociedade, que se baseia em um senso comum medíocre, e contra uma psicose oculta.
            Fico a esperar o quanto ele aguentará neste local. Junto à espera, há sempre uma resposta. Às vezes, não aceita por nós, mas correta.
            Quem me dera poder dar condições melhores a presos como João, que vivem entre paredes mofadas, de celas lotadas, com descasos políticos e sociais. Quem me dera que esse mundo se tornasse humano, e não racista.
            João acaba de reparar a minha presença ao seu lado. É melhor sair devagarzinho antes que o doutor Delegado me pegue fora do serviço.
           Com um olhar, dou meu “Até mais, grande João Miguel”.

                                                                                                                                                                                                                                                                            Eduardo Mulato do Vale





De joelhos aqui estou diante da cruz recém feita por mim. O desespero invade o meu coração. Transforma tudo que antes, para mim, era luz, em trevas. Uma cruz feita de dois paus amarrados e algumas pedras a sustentá-los será o eterno manto de meu filho, Josias?
Não morreu. Eu sei que ele não morreu. Está aqui, apertando meu coração, quase me levando a um infarto.
Essa rezadeira que não para de falar. Se ao menos trouxesse meu menino de volta.
Josias, por que você fez isso? Você não sabia que mandioca crua envenena a gente? Será melhor dessa forma? Será melhor do que ver você sofrendo?
Meu menino. Por que você me abandonou?
Seca desgraçada! Seca mortífera! Faz com que me sinta encarcerado em meus pensamentos. Que dor! Desperta, Josias!
Fome. Estou com muita fome. Olha lá a mandioca! Que vontade de comê-la. Não! Não seria isso que o menino iria querer. Será que ele está sentindo a minha falta? Sinto saudade, mesmo depois de algum tempo após a sua morte.
Onde está o senhor, São José? Onde estão tuas chuvas? Viu o que você fez com ele? A culpa é sua! Meu Senhor Jesus não iria querer essa desgraça.
Josias! Acorda, menino! Acorda... Por favor.
A mandioca desgraçada...
                           

                                                                                                        

                                                                             Eduardo Mulato do Vale 


Fonte da Imagem


            Neste ambiente escurecido, a umidade me faz arder de calor. As paredes constituem-se de um cheiro de mofo, são grossas e rígidas. Estou em uma prisão sob efeito do álcool. Não me julgo alcoólatra, apenas um apreciador de uma ardência que me leva a um pensamento orgástico.
Como cheguei até aqui? Estou vivendo a realidade ou são apenas alucinações? Estou deitado nos braços de Morfeu ou é apenas um reflexo do simpático na minha consciência?
            O efeito do álcool passa linearmente, assim como minhas idéias fluem.
Apresento-me em um diálogo com meu subconsciente, numa dimensão onde não sei como que cheguei lá, numa dimensão onde matar é possível.
Todos me abandonaram. Minha prisão não converge para reflexos corretivos, minha prisão é apenas uma intolerância de uma autoridade qualquer.
Matei alguém. Como posso esquecer-me disso?
Estava privado de sentidos. O que se apoderou de mim?
Aquele desgraçado! Se eu não tivesse passado a faca na sua barriga, eu seria a vítima... o morto. Não valeu a pena. Sorte que o doutor delegado percebeu a minha embriaguês. Sorte ou azar? Não foi o suficiente. Sei que terei perdido a minha dignidade quando for libertado.
Minhas condições mentais consideradas como analíticas são, em si, pouco suscetíveis a análises. Tentei me descobrir a cada dose de cachaça, mas afundei-me em pensamentos distorcidos, surrealistas.
Onde está tua consciência, João Miguel? Responde, homem! Estou mesmo ficando louco... Acho que vou dormir e esperar por mais um dia nesse lugar fétido. Não esqueça, subconsciente, que estarei mais um dia em busca da minha liberdade.
Espero estar curado ao despertar.



                                                                                    Eduardo Mulato do Vale